A Abelha Adélia e a perfeição do mundo
A abelhinha mais trabalhadora da colméia era Adélia. Dava duro demais a bichinha, parecendo mais ser uma máquina do que um inseto. Férias era palavra que não constava em seu vocabulário. No cartão de ponto colocado à porta da casa, para registro da entrada e retorno das operárias, na faina para buscar o pólen, só dava Adélia. Nunca faria isto, mas se quisesse poderia até reivindicar à sua Mãe Rainha incontáveis horas extras.
Com Adélia em definitivo que não havia tempo ruim. Quando não estava no trabalho de visita às flores para tomar-lhes o alimento, lá estava com a vassoura a limpar cada cantinho. Espanador batendo o pó que o movimento das asas trazia, ou mesmo com um pano trazendo brilho às paredes esmaecidas da colméia.
Vivia por lá satisfeita? Esse já é outro caso. Queixava-se bastante com seu travesseiro do tanto que as outras abelhas perdiam tempo. Do como brincavam demais, quando deviam estar produzindo. Da forma como entravam nas flores para buscar o mel, perdendo tempo nessa abordagem e não colhendo a quantidade de pólen que seriam capazes de carregar. Um eterno desperdício sentenciara, irritada.
Num desses dias, no qual se conjugava a situação bem boa de haver alta estocagem de pólen na colméia, com a circunstância ruim da existência de poucas flores nas redondezas e Adélia preenchia o tempo cuidando da faxina, percebeu, ao passar o pano num canto pouco visitado, algo que a incomodou profundamente. Uma coisa terrível e que nunca poderia ter acontecido, era o que dizia entre os ferrões no seu linguajar abelhal.
É que descobrira em meio aos milhares de alvéolos perfeitos da colméia, lá naquele cantinho do lado direito, um defeituoso. O prisma hexagonal regular dele não formava o ápice triédrico, em um dos seus lados. Algo que transgredia os cálculos precisos e as regras da boa construção, seguidos há tanto tempo pela engenheira de obras. Horror total ela murmurava. Que chefe e operárias incompetentes cometeram tal insanidade? E lá se foi ela, voando duro, cheia de raiva, a procurar as planilhas da obra para descobrir quem tinha sido a supervisora e as trabalhadoras, responsáveis por tamanho desatino.
Sua irritação, por mais que tentasse disfarçar que estivesse tranquila, apenas cuidando da boa ordem das coisas, podia ser percebida ao longe pelo zumbido distinto, mais forte das asas. Mas quem falou aí que ela se considerava raivosa ou mesmo irritada se engana. Não, o que dizia sentir não era nenhuma irritação. Afinal estava calma. Mais do que isto. Ela era, desde sempre, uma abelha tranquila. Este poderia muito bem ser um dos seus sobrenomes. Poderia se chamar, por que não, Adélia Calma da Silva? que da Silva, desde a Rainha, todas eram.
Na verdade não era bem assim que as amigas a viam. Na sua sabedoria de abelha idosa Amélia ponderava, longe dela é claro, que se a ela houvesse sido dado o sobrenome "Irada da Silva", poderia ser melhor reconhecida pelas vizinhanças. Mas paremos logo com essa trilha. Ela não será capaz de dar em nenhum lugar, que possamos considerar como relevante para a nossa história.
O que quero lhes contar agora é que tentando manter a pose do zumbido mais tranqüilo, mas rateando no zumzum de vez em quando, lá se foi a nossa amiga apresentar reclamação formal ao Departamento de Obras. Não foi assim de súbito. Aqui conto rápido, mas ela fez isto depois de alguns dias e neles todos, é bom que saibam, Adélia estava por dentro fervendo de raiva, dormindo mal, tendo mesmo problemas de estômago.
Não iria nunca fazer a reclamação de improviso, imaginem se ela erra... Primeiro foi para a sua sala pegou papel e caneta e em letras bonitas, sem nenhum erro, nem borrão, fez um relatório de oito paginas relatando o achado terrível.
O pessoal das Obras já era conhecedor do defeito. Sabiam dele desde a construção do alvéolo no cantinho, colado à parede interna do tronco onde moravam. Eles lembravam bem que à época aprovaram a solução trazida pela supervisora, eis que tratava-se da opção mais barata e simples naqueles dias, para se aproveitar o espaço e fazer o último recipiente colado à madeira. Não seria bom se gastar tempo, bem como se investiria bastante dinheiro, com coisas muito perfeitas. A hora era de eficácia. De fazer a coisa certa e mais produtiva, além de ter o menor custo.
Adélia, apesar de ter balançado a cabeça algumas vezes em sinal de aprovação, diante da equipe responsável pela obra, no fundo se mantinha insatisfeita com as explicações que lhe foram passadas e foi por isto que voltou para a sua sala com aquele conhecido zumbido estranho. Remoia-se nas entranhas, apesar do semblante parecer, visto mais distante, sereno. Alguém, uma abelha pouco mais observadora, poderia mesmo nos dizer que ela estava a ponto de chutar o pau da barraca.
Pegou de novo o pano de chão, enrolou-o num só golpe no rodo e lá se foi ela enxugando o piso, pois estávamos em tempos de chuvaradas. Negativo que houvesse problemas no escoamento da água que, pouco a pouco, ia pingando, trazida nas asas e no corpo das abelhas. O sistema de drenagem estava perfeito e a água naturalmente escorria pelo tronco depois de saída da colméia.
A questão era que, quanto mais irritada estivesse, mais implicada com limpeza e segurança se tornava. Piso molhado gerava lama, além de que provocava escorregões geradores de acidente. E lá seguia o rodo, aquela era a hora da ira, sendo esfregado a plena força, de vez em quando batendo nas perninhas de alguma irmã que se aventurasse ali por perto.
Ninguém sabia, mas havia num cantinho escondido, atrás de um alvéolo com fundo falso e que dava para um vão escuro da árvore, um lugar secreto de Adélia. Ali ela ficava naqueles raros momentos em que se deixava descansar. E pasmem, este lugar apesar do que demonstrava e apregoava nossa amiga fora dele, configurava-se numa bagunça total. Tudo sujo, nada era organizado, ou guardado. As coisas todas espalhadas pelo chão. Papéis rabiscados e amarrotados espalhados sobre a mesa. Escritos numa letra horrível e cheios de erros na língua abelhista e ainda, para piorar, com borrões aqui e ali.
Nesse local ela aliviava a tensão gerada por não conseguir permanecer, vinte e quatro horas por dia, na sua pose arrogante, autoritária e empertigada de não admitir imperfeições e erros, próprios e das demais e se irritar reclamando de tudo à volta, até tornar-se assim uma abelha chata e que as outras, quando podiam, sempre evitavam.
Foi num início de noite de verão que ela, enfim, nomeara o que costumava experimentar com as imperfeições. No início chamara de comichão o que sentia. Depois achou que era mesmo um excesso de energia acumulada. Afinal ela era uma abelha especial e tinha muita energia a consumir. Havia sido difícil admitir que o que tinha era irritação, daquelas mais bravas, que alguém pode um dia vir a sentir. Mas disse isso para alguém? Claro que não. Adélia bem que vivia na ilusão de achar que ninguém percebia, o que no seu íntimo se passava. Importava era manter a pose correta de tranquilidade e paz.
O sonho da nossa personagem era a colméia perfeita. A comunidade de abelhas onde tudo funcionasse sem atrasos, sem sujeiras, sem contratempos e com o mesmo padrão eficiente de visita às flores sendo cumprido por todas. Ela até costumava dizer que ainda iria ver na sua vida uma “abelha relógio” (era este o nome que dava ao seu ideal).
Amália a psicóloga, em conversas com ela, dizia-lhe que este se irritar constante se dava porque seu mundo interior estava confuso e então, para ao menos amenizar a dor de se saber bagunçada internamente, ela permanecia nesta busca incessante da perfeição do lado de fora. Esses eram assim papos descompromissados no ir e vir do trabalho, pois que terapia mesmo até poderia fazer, mas claro que nunca seria com uma abelha, como Amália, que ela sabia ter tantos defeitos.
Ao contar para vocês tais coisas me bateu aqui receio de que esteja passando a idéia, de que a nossa abelhinha trabalhadora não fosse bem considerada na sua família. Nada disso. Ela era respeitada. Inclusive, além desses tantos afazeres dos quais já sabem, Adélia era ainda a responsável pela educação de muitas criancinhas e adolescentes e fazia isto com uma competência tremenda. Reconhecia-se de longe as abelhas que tinham passado pelas suas salas de aula.
Sabedora, naquela colméia havia muitas fofocas, dos problemas que a aflição e irritação causavam em sua súdita, a Rainha resolveu chamá-la para uma conversa. Ao ser convocada para comparecer diante do trono, os problemas estomacais da nossa abelha aumentaram. Parecia haver uma fornalha na barriga, era o que relatava à doutora. Relutara muito em ir à médica e só tomara a decisão de comparecer, porque precisava estar bem diante da Mãe Rainha e a Doutora tinha sido enfática. Só lhe forneceria um novo pote de antiácido caso aparecesse em seu consultório para uma consulta.
O que está havendo, minha filha? Todas estamos tão preocupadas com você. Adélia já chegou chorando diante da mãe e com ela não haveria porque esconder algo. Está tão complicado viver aqui em casa, mamãe. Por que está difícil, minha menina querida? É que aqui tem muitos erros, há defeitos demais e a cada hora que me deparo com um deles, me vem esta raiva interna e que depois acaba se transformando em culpa e irritação. Antes me controlava bem, fingia que não via, que não era comigo e seguia em frente. Só que não consigo mais fazer isto e o fato é que esta irritação está me adoecendo, mamãe.
A Rainha sorria carinhosa para sua abelha chorosa e nem precisou pensar muito. Como toda Rainha que já deve saber de tudo o que precisam seus súditos, a Grande Mãe pegou a pasta real que estava ao lado. Lá de dentro tirou dois tickets. Toma minha filha. Estas passagens estão em aberto. Aqui tem também uma lista de lugares para você escolher em qual deles gostaria de passar uns dias.
Mas, mamãe, ela de imediato foi falando. Eu não posso tirar férias. Há tanta coisa por fazer, tanto a consertar, a arrumar, limpar. Por favor, deixe-me quieta aqui no lar. Quem disse que serão férias, Adélia? Eu estou lhe enviando para um estágio. Ordeno que, ainda no dia de hoje, apanhe suas roupas, seus remédios e livros, arrume com muito cuidado a mala e fique aonde for, observando as coisas.
Sem ter como refutar e tentando de toda maneira esconder a irritação presente na voz, pergunta então: O que devo observar? Mãe Rainha, por obséquio, seja mais clara nas suas ordens. Observe como é o mundo, minha filha. Isto é pouco, mamãe. Explique melhor o que espera de mim. Foi o que Adélia mais uma vez pediu. Mas a Rainha já estava se virando para tratar de outro caso e nossa amiga, que precisava de tudo muito bem explicado para não haver dúvidas e possibilidades de engano, teria que se virar somente com aquelas poucas palavras da mãe. Foi assim que, com as duas passagens nas mãos e ansiosa, eis que se preocupar muito com o que irá viver era uma das suas características, Adélia saiu da audiência real.
Ordem é para ser obedecida e lá se vai Adélia voando para a Rodoviária. Dois dias depois, já que o mundo se situava bem longe de onde morava, nossa heroína chega ao destino. A observação que iria fazer, começa a compreender, era dos seres humanos. Da forma como viviam nas comunidades. Essa gente que quando aparecia por perto da colméia, tinha a habilidade estranha e mágica de fazer sumir o mel que, com tanto carinho e cuidado, era por elas estocado. Por conta disto, é bom que se diga, os humanos eram muito mal vistos.
A primeira coisa observada por Adélia foi uma plantação de árvores. Todas certinhas, do mesmo tamanho e formato. Pareciam mais terem saído de uma linha fabril de produção. Que coisa mais linda falou para si mesma. Nunca vi algo tão bonito. Tratava-se de uma floresta de eucaliptos, foi o que logo ficou sabendo por ter perguntado ao casal de vespas que passou voando ao lado. Pousou no telhado da casa do homem que cuidava da linda floresta e ficou por ali no afã da tal observação.
Nem precisou passar muito tempo para notar que os pássaros evitavam aquela floresta tão perfeita. Voou para dentro dela e pôde sentir o silêncio que lá reinava. Voar ali no início, por causa da novidade, foi até interessante, mas não tinha passado nem um minuto e tudo virara uma monotonia só. Fez algumas curvas para ver se encontrava algo diferente e nada. Tudo era igual, tinha a sensação de ver e rever constantemente a mesma coisa.
Foi dando nela um medo que ia só aumentando e o que pensou foi que, antes que ele se transformasse em pânico e a paralisasse, melhor seria que saísse de imediato dali. Mas onde era a saída? Tudo igual, tudo certinho, tudo labirinticamente, geometricamente correto. Nem uma trilha, um regato, uma árvore diferente, uma seta, ou placa para sinalizar havia. Mira então uma direção e voa reto até conseguir escapar, aliviada, daquela mesmice chata, que era como ela agora nomeava aquele lugar.
Chegara numa floresta natural, parecida com a sua e que nunca tinha valorizado, por achar tudo bastante desordenado. Cá entre nós, poderíamos dizer que, inclusive, a achava das mais feias. Cada árvore de um tamanho, cada folha com o seu formato, cada tronco com seu desenho. Ufa, foi o que exclamou. Aqui nem é bonito, mas é bem mais agradável. De novo voltara o barulho, passarinhos voando e cantando, burburinho de bichos em movimento, insetos de todos os formatos, voadores, rasteiros e mesmo uns tentando retornar para o seu habitat subterrâneo, ela conseguia observar.
Pujança de vida tinha ali naquela mata. Resolve subir, realizando vôo de helicóptero, e do alto vê o verde padronizado da plantação pela qual passara, e o compara com as miríades de verde a compor o conjunto do lugar onde agora estava. Salpicado nele tinha o colorido das árvores em floração. As flores, essas que lhe eram tão caras e que ali eram milhões, talvez bilhões delas, de todos os tipos, formatos e coloridos. Ao longe reconhece seu telhado solitário e é para ele que, depois de traçar uma reta, voa.
Cansada, afinal foram muito intensos os sentimentos experimentados nas expedições feitas, nem bem se acomoda no canto que arrumara numa ripa sob as telhas, já dorme. Acorda com o barulho vindo de dentro da casa. Voa até a janela e de lá observa o que dentro se passa. Na cozinha uma mulher faz café numa chaleira amassada e sem alça. No chão duas crianças brincam com a bola meio murcha, irregular. O homem vem entrando e seus braços carregam um feixe de lenha. Cada uma de um jeito, de um tamanho, com sua respectiva espessura e, absurdo dos absurdos, várias delas mal cortadas.
O primeiro sentimento que lhe vem do segundo dia da observação é bem conhecido. Chega voando nela e nem lhe pede licença, a irritação. Que coisa horrível, diz baixinho. Nada aqui está certo. Como conseguem viver assim? Vai passando o tempo e Adélia começa a reparar que vivem em paz, são alegres. Apesar de tanta coisa errada ninguém está irritado. Pouco a pouco vai se dando conta de que deve ser interessante se viver daquela forma, pois que a existência se torna mais dinâmica e cheia de surpresas.
Por fim a nossa heroína chega à conclusão de que ninguém ali é igual ao outro. Cada qual tem seu jeito próprio de ser e essa forma de existir única é valorizada pelos demais. O homem respeita o jeito da mulher e a forma como ela faz as suas coisas. Mesmo, reparara isto, achando que a sua maneira de realizá-la seria melhor. A criança tem seu universo preservado e a liberdade para brincar e criar nos seus jogos, com a bola esquisita, outras formas criativas para se divertir.
E foi desse jeito que passou o dia. Quando bateu fome entrou pela cozinha e comeu junto com algumas formigas que tentaram se comunicar com ela; Pena que aquela língua lhe fosse incompreensível, na lata de açúcar que esqueceram aberta. O final da tarde e o início da noite serviram para escrever mais uma parte do relatório. Nessa hora Adélia já tinha certeza do aonde sua sábia Mãe Rainha quisera chegar com essa idéia de estágio. Naqueles dois dias aprendera mais que em toda a vida em casa. Acha que já está pronta para retornar à colméia, mas resolve explorar outro lance misterioso que vira ao longe, quando daquele vôo mais alto sobre a floresta.
Lá, ao Sul, havia algo totalmente diferente da floresta certinha de eucaliptos e da mata com as árvores todas misturadas que já conhecia e aprendera a admirar. Foi o morcego que morava também sob o forro que lhe explicara que aquilo lá era uma coisa que os humanos chamavam de cidade. No dia seguinte iria acordar bem cedo para observar este outro ambiente.
O sol ainda era metade quando a viu voando para as bandas do Sul. Ainda longe escutava o que parecia um rumor surdo, que daquele lugar lhe vinha. Adélia chega pela hora do rush matinal. Assusta-se com as grandes avenidas, com os viadutos, as casas altíssimas e algo como lagartas imensas, com rodas ao invés de pés que engoliam, não pela boca como era de se esperar, mas pela barriga, as pessoas que se postavam ao lado delas.
Nossa amiga estava deveras atordoada. Nada fazia sentido. Qual é o padrão disto? Ela se perguntava falando alto por causa do barulho e sendo ouvida por um pardal. O padrão é a liberdade, amiga. Ser livre para se fazer a casa como se acha mais bonita, mesmo que para todos os demais ela pareça horrorosa. A liberdade de ir e vir pelas ruas e avenidas. De se trabalhar quando se é hora de produzir e de descansar e curtir o lazer quando for este o momento.
A liberdade enfim de se expor. De errar porque a falha é algo inerente à vida. E não é porque se cometeu enganos que se deva ficar remoendo, por um montão de tempo, culpa ou irritação. Mas não se iluda porque há gente ai também dentro da cidade, que não pensa assim e que chega a achar que as pessoas não devem ser livres. Preferem que elas sejam todas certinhas e o erro lhes é cobrado muito caro.
Exigem que permaneçam dentro de prisões que parecem colméias. E quando ele falou esta palavra Adélia sentiu um arrepio. A liberdade de se sentir diferente e amado porque se é assim e não porque se segue este ou aquele padrão. O padrão é Deus e Deus é Amor e o Amor é liberdade. Aprenda o que lhe ensino e nunca se esqueça dessa verdade, Adélia. Assim terminou seu discurso, aquele sábio pardal, ao mesmo tempo em que mergulhava em direção a um jardm.
Antes de voltar para casa a abelhinha observadora passou pelo telhado, no intuito de redigir os dois últimos capítulos do relatório para Mãe Rainha. No da observação sobre a cidade limitou-se a reproduzir, com letras bordadas, as palavras do pardal que ela agora considerava suplantar a coruja em sabedoria. No último, aquele capítulo que concluía o estágio, escreveu sobre o respeito das diferenças e a aceitação das outras abelhas e do trabalho delas, mesmo que ele não se processasse da forma que ela imaginava ser perfeita.
Mãe Rainha a recebeu com um abraço forte e leu tudo aprovando com a pequena cabeça, desproporcional ao corpanzil, mandando que se publicasse na Folha Abelhuda aquela reportagem. Ela notava que havia mais filhas que sentiam o mundo da mesma maneira que Adélia e seria bom que lessem e refletissem sobre as observações da estagiária. Abelha conhecedora do mundo e viajada, Adélia agora, além de professora reconhecida, era também consultora de complexos e variados assuntos na comunidade. Resolveu tirar férias, o que não deixou de assustar s amigas. Vocês se recordam de que ela nunca se dera este direito, não é?
Encontrei num dia desses, em meio à papelada, um cartão postal de umas férias de Adélia. A paisagem da foto é bonita e bem diversificada. Numa primeira vista pode dar a impressão de algo meio bagunçado. O carimbo é de um país que não consegui reconhecer. Maravilhada ela conta da realidade da terra. Que nela há muita liberdade e que todos, abelhas e seres humanos, vivem tranquilos, cada um do seu jeito.
Foi dessa forma que escreveu e faço questão de transcrever suas palavras: “cada qual com o seu cada qual”. Custei a entender o que quis dizer com isto. Acho que o significado é que eles estão em paz e se respeitam mutuamente, sem autocobranças e nem implicâncias, assim do jeito que vão sendo criados por Deus.
Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 13/07/2010
Alterado em 05/01/2016