Fernando Cyrino

Caminhando e saboreando a vida.

Textos


Liturgia da Missa - Reflexão sobre a Mesa da Palavra do Quarto Domingo da Páscoa - Ano A – O Bom Pastor é a Porta para a vida em abundância.

Era uma porta que nunca se fechava. E porque se mantinha sempre, dia e noite, aberta, começaram a achar que ela fosse inútil. “Para que uma porta que nunca se cerra?” Era o que andavam dizendo. Tanto fizeram que ela acabou sendo retirada. Só que as coisas não deram certo. É que as pessoas,aos poucos,  ficaram perdidas. Não havendo mais a porta entravam e saiam por qualquer lugar e agindo assim não conseguiam mais se encontrar e muito menos àquilo que necessitavam para serem felizes. Passou-se um tempo e, por não haver mais a porta, perderam inclusive a noção de dentro e fora. Não havia pessoa que fosse capaz de dizer se algo estava posicionado interna ou externamente. Aquela falta fez com que as referências fossem perdidas. Mais um pouco e ninguém se reconhecia mais, tornaram-se estranhos uns para os outros. Aquele povo, a começar dos que tinham achado ser a porta desnecessária, sentia-se inseguro, solitário e sem rumo. Perdeu a noção do sentido para aonde ia e de onde tinha chegado. Foi então que se lembraram da porta. Resolveram buscá-la e reinstalá-la. Não se passara nem um dia e aconteceu algo bonito. É que eles foram se redescobrindo como amigos e comunidade. Ao passar pela porta ao final do dia para descansar, sentiam-se em segurança entre irmãos. Ao sair para trabalhar por ela pela manhã, levavam a certeza de possuír um lugar para retornar, onde seriam acolhidos pela porta que, agora sabiam, era muito mais do que simples referência. Ela os reconhecia e os tratava, cuidadosa, pelo nome. Aquela porta os amava e por cada um deles seria capaz de dar a própria vida.

Neste domingo Jesus vem nos falar de uma realidade que nos é um tanto distante. João nos traz a imagem rural do pastor de ovelhas. Uma figura que praticamente inexiste no nosso país. Nem a profissão de vaqueiro, que a primeira vista poderia se assemelhar a ela, é comparável à do pastor que nos é trazida desde o Oriente e se encontra na Bíblia, tanto no Primeiro, quando a temos no Salmo 23 que também rezamos hoje, quanto no Novo Testamento, desde as narrativas do nascimento de Jesus.

Os pastores, ao entardecer, levavam seus rebanhos para um abrigo comum. Um quadrado num local protegido, muitas vezes feitos com muros de pedra. Para maior segurança tal local possuía uma só porta estreita. Noite adentro um dos pastores permanecia em vigília cuidando dos rebanhos de todos. À primeira luz do dia cada um deles se punha do lado de fora e ia chamando suas ovelhas. Elas reconheciam aquelas vozes e saiam se agrupando em volta dele.

João nos conta essa parábola enfatizando através das imagens da porta e do pastor, bem marcantes e significativas para aquela gente, quem é esse Jesus a quem seguimos: Ele se define como a porta pela qual suas ovelhas deverão passar, na entrada e saída do redil e também do pastor bom, aquele que é tão cuidadoso com as ovelhas, que está até pronto a dar a sua vida por elas.

Jesus é a nossa porta. Uma porta sempre aberta e pronta para nos acolher. Sim, ela possui chave, mas o incrível disto é que quem a guarda não é o pastor, mas cada uma das suas ovelhas. Cada um de nós recebeu uma cópia dela e poderemos, a qualquer hora, entrar na segurança e carinho do seu amor.. Nós precisamos de sinais. Não basta amar sem demonstrar que se está amando. A porta é esse sinal necessário para sentirmos em nós esse amor-cuidado e carinhoso de Deus que nos quer vivos, mas não de qualquer jeito, vivos plenamente.

Mas não basta termos o Senhor como Porta. Como Ele também precisamos ser portas acessíveis, deixando que os irmãos entrem e saiam de nós. É que na vida temos uma grande tentação enquanto portas. A de nos cerrarmos totalmente e por segurança ainda engolirmos ou escondermos a chave, para não deixar que ninguém chegue até nós. Trata-se da tentação do egoísmo, de achar que nos bastamos e que não precisamos de ninguém. Nesse tipo de tentação é possível que nos achemos muito ligados a Deus, mas nos enganamos. Para chegar a Ele precisamos reconhecê-lo também nas suas ovelhas.

O Bom Pastor cuida da vida das suas ovelhas e não se contenta com que elas vivam somente. Ele quer muito mais. Que elas tenham uma vida completa. Vida em abundância é o que Ele quer e busca para elas. Olhando em volta reparamos que há muita gente por aí que até pensa que tem vida, mas segue praticamente morto. Sua vida é pequenina porque pode estar lhe faltando dignidade e cuidado dos seus pastores, nós inclusive. Há também aqueles que levados para outros abrigos, reduzem suas vidas a um mero vegetar, possuídos pelas drogas, o consumismo e por tantos vícios e afetos desordenados.

Jesus é o bom pastor. A figura do pastor, tão reconhecida naquela cultura, não deixa de ser polêmica. Na verdade esta não era uma profissão bem quista. É bom refletir também que a imagem do pastor e das ovelhas, apesar da sua beleza pastoril e do seu encanto a nos trazer segurança, precisa ser olhada com certo cuidado.

Ser ovelha não é se tornar passivo e medroso de quesitonar e perguntar os porquês das coisas. É ter voz e vez diante de Jesus. O Bom Pastor não quer nenhuma de suas ovelhinhas sem pensar, refletir a sua fé e o seguimento. Antigamente, quando se queria falar de alguém que não possuía opinião ou vontade própria, concordando com tudo, dizia-se ser uma “vaquinha de presépio”.

Somos as ovelhas do Bom Pastor, mas não “ovelhinhas de presépio”. “Ovelhas”seguidoras e conscientes da responsabilidade na construção do mundo. Discípulos missionários no cuidado do Reino. Ao mesmo tempo também somos pastores. Não somente Jesus o foi e os componentes da Igreja hierárquica o são. Todo batizado precisa se assumir como pastor, cuidando do seu próximo. Nessa dimensão, como vivemos em comunidade, cada um de nós é ao mesmo tempo ovelha e pastor.

Para refletir:

- Reconheço a voz do meu Pastor?

- Tenho sido uma “porta” acessível?

- Tenho cuidado, como um bom pastor da minha família, amigos, comunidade,
trabalho?

1ª Leitura - At 2,14a.36-41
No dia de Pentecostes, Pedro, de pé, no meio dos Onze apóstolos, levantou a voz e falou à multidão. Que todo o povo de Israel reconheça com plena certeza: Deus constituiu Senhor e Cristo a este Jesus que vós crucificastes.' Quando ouviram isso, eles ficaram com o coração aflito, e perguntaram a Pedro e aos outros apóstolos: 'Irmãos, o que devemos fazer?' Pedro respondeu: 'Convertei-vos e cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo para o perdão dos vossos pecados. E vós recebereis o dom do Espírito Santo. Pois a promessa é para vós e vossos filhos, e para todos aqueles que estão longe, todos aqueles que o Senhor nosso Deus chamar para si.' Com muitas outras palavras, Pedro lhes dava testemunho, e os exortava, dizendo: 'Salvai-vos dessa gente corrompida!' Os que aceitaram as palavras de Pedro receberam o batismo. Naquele dia, mais ou menos três mil pessoas se uniram a eles.

2ª Leitura - 1Pd 2,20b-25
Caríssimos: Se suportais com paciência aquilo que sofreis por ter feito o bem, isto vos torna agradáveis diante de Deus. De fato, para isto fostes chamados. Também Cristo sofreu por vós deixando-vos um exemplo, a fim de que sigais os seus passos. Ele não cometeu pecado algum, mentira nenhuma foi encontrada em sua boca. Quando injuriado, não retribuía as injúrias; atormentado, não ameaçava;
antes, colocava a sua causa nas mãos daquele que julga com justiça. Sobre a cruz, carregou nossos pecados em seu próprio corpo, a fim de que, mortos para os pecados, vivamos para a justiça. Por suas feridas fostes curados. Andáveis como ovelhas desgarradas, mas agora voltastes ao pastor e guarda de vossas vidas.

Evangelho - Jo 10,1-10
Naquele tempo, disse Jesus: ‘Em verdade, em verdade vos digo, quem não entra no redil das ovelhas pela porta, mas sobe por outro lugar, é ladrão e assaltante. Quem entra pela porta é o pastor das ovelhas. A esse o porteiro abre, e as ovelhas escutam a sua voz; ele chama as ovelhas pelo nome e as conduz para fora. E, depois de fazer sair todas as que são suas, caminha à sua frente, e as ovelhas o seguem, porque conhecem a sua voz. Mas não seguem um estranho, antes fogem dele, porque não conhecem a voz dos estranhos.' Jesus contou-lhes esta parábola, mas eles não entenderam o que ele queria dizer. Então Jesus continuou: 'Em verdade, em verdade vos digo, eu sou a porta das ovelhas. Todos aqueles que vieram antes de mim são ladrões e assaltantes, mas as ovelhas não os escutaram.
Eu sou a porta. Quem entrar por mim, será salvo; entrará e sairá e encontrará pastagem. O ladrão só vem para roubar, matar e destruir. Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância.


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Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 09/05/2011
Alterado em 28/04/2023


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