Fernando Cyrino

Caminhando e saboreando a vida.

Textos


Doidices de estrelas? Carece de se assuntar melhor o que se passa quando acontece delas perderem o siso. Há gente que diz que malucas são as que apreciam viver lá no alto de cabeça pra baixo. Aí elas, que têm mãozinhas parecidas com as de morcego, se seguram no manto estendido do céu, por modo de não cair. As de maior ensandecimento, essas chegam a furar o pano de tanto que suas unhas nele se enfiam.

Outros entendidos do comportamento estrelar já contam o contrário. Dizem esses que as doidas são as que apreciam o vento forte no rosto, ao cair num risco xispe-xispe de luz. Nos seus escritos sobre o assunto até relatam que elas, ao olharem para a terra, vêem que um montão de viventes nada tem de normal. Daí que cansadas de conviver com suas irmãs insossas e sofrendo da incapacidade de surpreender, de tão certinhas que são, resolvem pular para o lugar onde a mesmice não existe, desde aqueles tempos em que lamparina era luz de fio.

O azeite elas gastam todinho na queda e aqui no chão precisam logo de se acostumar com o breu das noites sem lua. As medrosas sofrem demais naquelas madrugadas de dia que nunca chega. As pedras pretinhas e lisas que de vez em quando, na desatenção de não se procurar, se acha em beira de córregos, são dessas estrelinhas vazias que, tadinhas, não alumiam mais.

No mesmo dizer de doce com queijo, Cosme e Damião e amor com beijo deve-se de considerar estrela e sertão. Esses também são mais do que par. É quase mesmo uma coisa única que aprecio de ficar descobrindo neles, umas insuspeitadas bonitezas.

Carece de parar aqui. Conversa encompridada arrisca de virar ladainha de cansar até santo. Há uns, me disseram cochichado, que foram pegos no bem bom do ronco, no meio dessas histórias de não se acabar jamais. Buscando estrelas no cascalho, consegui apanhar cinco badaladas dos sininhos de asas, de uma borboleta amarela que voava por perto. Do barulhinho que quase ouvi, consegui salvar três de uma asa e só dois da outra que rápido, enfiei num saquinho guardado na gaveta dos bem quereres.

Para se abrir é necessário encher os dedos de delicadeza, ao mesmo tempo em que se vá ampliando os ouvidos do coração, até que quase espoquem pelas orelhas, para não perder nenhum desses blimblimblim, que por mim foram surpreendidos e mantenho bem escondidos.

No restinho da tinta conto que estrelas, desconfio, há de dois tipos. Têm as doidas e as doídas. Todas elas, ou carregam algum tipo de maluquice, ou jeito de dor e sofrimento. Em que lugar cada um desses tipos mora eu acho que ainda nem sei.

 
Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 16/10/2011
Alterado em 26/01/2016


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