Fernando Cyrino

Caminhando e saboreando a vida.

Textos


Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra – Jesus e o fundamentalismo – 19º Domingo do Tempo Comum – Ano B 
Os judeus começaram a murmurar a respeito de Jesus, porque havia dito: “Eu sou o pão que desceu do céu”. Eles comentavam: “Não é este Jesus o filho de José? Não conhecemos seu pai e sua mãe? Como pode então dizer que desceu do céu?” Jesus respondeu: “Não murmureis entre vós. Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou não o atrai. E eu o ressuscitarei no último dia. Está escrito nos profetas: ‘Todos serão discípulos de Deus’. Ora, todo aquele que escutou o Pai, e por ele foi instruído, vem a mim. Não que alguém já tenha visto o Pai. Só aquele que vem de junto de Deus viu o Pai. Em verdade, em verdade vos digo, quem crê, possui a vida eterna. Eu sou o pão da vida. Os vossos pais comeram o maná no deserto e, no entanto, morreram. Eis aqui o pão que desce do céu: quem dele comer, nunca morrerá. Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão que eu darei é a minha carne dada para a vida do mundo”.Jo 6,41-51

O rapaz ao telefone convida o amigo para participar do grupo de jovens. Para animá-lo, lhe diz: “lá é sinistro”. A avó escuta e quase tem um infarto. Corre a murmurar aos ouvidos maternos. Quer que a mãe o proíba de participar da Igreja. Seus ouvidos não captaram a mudança de sentido da palavra. Ela não atentou para o fato de que no meio juvenil este termo ganhou sentido bastante positivo.

Seguimos Jesus ainda através do Evangelho de João. Vamos nos aprofundando um pouco mais no seu discurso Eucarístico. Jesus comida é o motivo base a sustentar toda essa parte da teologia joanina. Mas com certeza que há, a partir deste núcleo central, bem mais a ser refletido. Dentre esses, trago aqui cinco pontos para a nossa meditação.

O murmúrio – Os judeus murmuravam contra Jesus. Assim tem início o relato do evangelista. Há murmúrios positivos como as palavras de amor sussurradas ao amado. Há também os negativos e dentre estes três são mais significativos para este momento.

O primeiro é o “murmúrio bico”. Nomeio-o assim porque quando o temos é comum que aconteça o biquinho feito com os lábios. Dá-se pela insatisfação com alguma decisão ou encaminhamento dado às questões. Pode ser também fruto de inveja. É feito de susceptibilidades e termina fazendo com que o bicudo se mantenha afastado, resmungando pelos cantos.
Faz isto para si mesmo, como se falasse aos próprios cotovelos. Não será difícil percebê-lo descarregando seus pesos em cima de alguém seu desagrado. Faz isto na busca da concordância com seu bico.

O não entendimento é o causador do segundo modo de murmúrio. É por não se compreender algo que se inicia o  murmurar. Obviamente que seria bem mais simples e eficaz realizar um pedido de explicações, ou, quem sabe, partir para o estudo do tema. É desse tipo o murmúrio acontecido no relato desse Evangelho.

O terceiro jeito de murmuração é mais destruidor: a fofoca. É o murmúrio maldoso acontecido a partir do que se inventa, ouve falar, ou da ampliação do fato: “conte um conto e aumente um ponto”. Algumas vezes esse murmúrio vem embrulhado para presente. Acontece no que se pode chamar de “mentira amor”. Fofoca-se para ajudar alguma causa ou a alguém. Mesmo bem intencionados eles não costumam levar a um bom lugar. Ao contrário, destroem a confiança. 

O fundamentalismo – Começa com a leitura e interpretação literal do que se ouve, ou lê. Entende-se as coisas ao pé da letra, como acontecido com aqueles judeus desse Evangelho. Por isto afirmam a impossibilidade de Jesus ser o pão vivo descido do céu. Assinam seu atestado fundamentalista questionando: “Como Ele pode ser pão? Conhecemos seus pais...”

Há gente demais com visão fundamentalista por aí. A fala e o texto só podem ser entendidos dentro do seu contexto. É necessário considerar, na interpretação, cultura, data e mais além daquilo que esteja sendo dito, o que realmente o autor quis afirmar.

A fé – Vale também a consideração de três pontos:
1 – Pressupõe sempre a possibilidade da dúvida. Pode ser perigosa quando não possui questionamentos. Tende a ficar rasa, torna-se raquítica e ao primeiro vendaval despenca. Por isto, em relação à fé a crise, mesmo sendo dolorosa, pode ser bastante bem-vinda. Precisa ser vista como oportunidade de crescimento a partir dos questionamentos que suscita em seu bojo. 

2 – É mais sentir do que pensar. A fé de quem só pensa cai na crença fria do filósofo. Há que se experimentar Deus e não ficar somente pensando nele.

3 – É dom de Deus. Nasce no Pai esse desejo profundo de seguir Jesus. É Ele e o Espírito Santo quem nos atraem na direção do Filho. É necessário agradecer pela fé que possuímos, eis que é dádiva do Senhor e só pode ser posta nele. A fé é graça. 

A ressurreição – Aos olhos de quem não crê trata-se do maior absurdo que professamos. Aos olhos dos que acreditam é nada mais nada menos (mesmo que em meio a possíveis dúvidas) da certeza do Amor infinito e eterno de Deus para com seus filhos. Cremos na ressurreição dos mortos porque sabemos que da mesma forma que Jesus foi ressuscitado pelo Pai, também nós seus filhos, seremos por Ele resgatados da noite escura da morte.

Crer no Ressuscitado é ter a certeza, misturada às vezes aos questionamentos, de que com Ele, por Ele e Nele iremos, um dia, também ressurgir numa vida plena. Não sabemos como será, mas confiamos que terá, além de todas as pessoas amadas, também tudo aquilo que mais gostamos. Deus já preparou tudo para que sejamos plena e eternamente felizes.

O pão para a vida – Jesus é o Pão da Vida. Ele nos afirma ser o pão que nos é dado para a vida no mundo. É usando o símbolo do pão, alimento praticamente universal, que Jesus nos alimenta para que ganhemos força e coragem para a missão. Esta deverá estar alinhada com a caridade, ou seja, com a distribuição, de alguma maneira, eis que há vários modos para isto, do pão.

Um fundamentalista veria nesta frase a chamada para construirmos milhões de padarias. É muito mais do que isto. O mundo sente fome de diversos tipos de pão. Além do pão comida, faz falta demais por aí o pão do cuidado, da atenção, do carinho, da mão amiga, do afeto, da justiça, da paz...

Claro que falta também o Pão Eucarístico para muita gente. Nesses tempos de pandemia muitos de nós só têm comungado espiritualmente. A sua maior dificuldade durante esses tempos tão duros, é oportunidade para que mais o valorizemos,  lhe dando a devida importância e dignidade. .

Pequena oração sugerida para ser rezada depois da comunhão:
Jesus, livra-nos do fundamentalismo Eucarístico. Este de considerar que a Comunhão começa e se encerra no gostoso de recebê-lo na missa. Que o seu Corpo, Pão da Vida, a nos alimentar, aumente nossa fé e nos envie, cheios de ânimo e coragem, para testemunhar a fé na dura realidade do dia a dia. Que saiamos da Mesa Eucarística como autênticos discípulos missionários, construtores de um mundo novo de justiça e paz. Amém.

Pistas para reflexão durante a semana:

- Identifico na vida meus tempos de murmúrios?

- Minha fé gera questões? Tenho buscado respondê-las, aprofundando-me nelas?

- Que tipo de pão distribuo?


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Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 06/08/2012
Alterado em 07/08/2021


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