Fernando Cyrino

Caminhando e saboreando a vida.

Textos


Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra – Quem é mesmo Jesus para mim? – 24º Domingo do Tempo Comum – Ano B 

Jesus partiu com os discípulos para as aldeias de Cesareia de Filipe. No caminho, fez aos discípulos esta pergunta: «Quem dizem os homens que Eu sou?» Disseram-lhe: «João Baptista; outros, Elias; e outros, que és um dos profetas.» «E vós, quem dizeis que Eu sou?» perguntou-lhes. Pedro tomou a palavra, e disse: «Tu és o Messias.» Ordenou-lhes, então, que não dissessem isto a ninguém. Começou, depois, a ensinar-lhes que o Filho do Homem tinha de sofrer muito e ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e pelos doutores da Lei, e ser morto e ressuscitar depois de três dias. E dizia claramente estas coisas. Pedro, desviando-se com Ele um pouco, começou a repreendê-lo. Mas Jesus, voltando-se e olhando para os discípulos, repreendeu Pedro, dizendo-lhe: «Vai-te da minha frente, Satanás, porque os teus pensamentos não são os de Deus, mas os dos homens.» Chamando a si a multidão, juntamente com os discípulos, disse-lhes: «Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. Na verdade, quem quiser salvar a sua vida, há-de perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, há-de salvá-la. Mc 8, 27-35

Imaginem uma pessoa chata... Pois ela era assim. Suas conversas não duravam mais do que cinco minutos. Que se saiba, só uma pessoa aguentava seu papo repetitivo, circular e sem muito tirocínio, como diziam os antigos. Pois esse chato era vizinho do irmão de um bispo. Certo dia, que essas coisas não passam despercebidas, ele soube que o tal bispo visitava o mano após compromissos no Rio de Janeiro e antes de retornar num ônibus para a sua Mariana, sede da sua diocese. Correu para ir ter com ele - e aqui há algo que esqueci de lhes contar. Era exatamente o tal bispo aquele que aguentava sua conversa para boi dormir. Chegou, sentou-se à sala onde conversavam e esses, pouco a pouco, pela chatice da vizinho, foram saíndo de fininho. Só os dois permaneceram. O bispo que a tudo escutava com atenção, sem demonstrar impaciência, ou aborrecimento, e o nosso chato de galocha. O problema foi que ia se aproximando o horário do ônibus. Aflito, o irmão do bispo, lá da porta, tentando ser discreto, lhe apontava o relógio e ele a lhe fazer sinais para que aguardasse. Foi assim até que o irmão, no auge da aflição, se deu conta de que se passassem mais cinco minutos não alcançariam o ônibus. Disse então: “Perderemos a viagem se não sairmos agora”. O bispo retrucou calmamente: “Mas não haverá outro ônibus mais tarde?” “Sim, mas será convencional e este para o qual lhe compramos a passagem é executivo, pois que você já não é jovem, sofreu um acidente sério e precisa de um pouco de conforto". “Pois irei no convencional”. Foi o que definiu para encurtar a conversa e o bate papo durou mais um tempo. Terminado enfim, o que o chato tinha a lhe contar, ele apanha sorridente a sua malinha.”Estou pronto”. O irmão dirigia o carro emburrado: "Dar tanta conversa para essa pessoa fez com que perdesse o horário da viagem”. Ele o olha com carinho e responde: “Mas já que vocês nunca têm tempo e paciência para escutá-la alguém precisa fazer isto”. E era assim, gastando a vida com as pessoas - até mesmo os chatos - que Dom Luciano Mendes de Almeida ia vivendo...

O Evangelho deste domingo me põe diante de uma questão fundamental: Quem é Jesus para mim? Desta resposta serão delineados os caminhos a serem seguidos na minha vida daí por diante. Ela me direcionará para o sentido de Deus, ou me levará por outras estradas, que poderão mesmo me deixar  afastado dele.

Jesus, Marcos nos conta assim, apresenta esta pergunta no caminho e isto tem significado. Para cada um de nós tal questionamento também acontece na “estrada”. Vai muito além dos bancos do templo, nos quais estamos situados durante as celebrações. A resposta, que é fundamental, se dará na intimidade do coração, mas será necessário que se torne refletida nas ações simples do dia a dia e não somente se faça presente nos grandes momentos, bem raros para a grande maioria de nós.

Ela ocorrerá principalmente na relação com os pequeninos, como na historinha de Dom Luciano. Estes estão vivos, bem presentes à nossa volta. Na verdade a resposta não comporta mortos, como os discípulos inicialmente disseram: João Batista havia sido decapitado e Elias também já tinha ido embora, arrebatado num carro de fogo.

Não se assume como Senhor aquele que não é conhecido. A profissão de fé se dá na experiência, mas para que aconteça, é necessário que haja o conhecimento interno de Jesus. Seguir o Ressuscitado na vida, pressupõe tê-lo conhecido no Evangelho e, diante das situações enfrentadas e que geram dúvidas, se fazer a pergunta: Como Ele agiria se estivesse aqui nesse meu lugar?

Assumir Jesus como o Messias traz responsabilidades, tornando o discípulo adulto na fé. Faz com que se reavaliem critérios. Nesse processo é provável que se vá deparar com respostas que levem até às fronteiras da fé. Lugares bem distantes do conforto e da segurança dos ambientes costumeiros da Igreja. Assumir o Messias é se postar aberto para discernir, pessoal e comunitariamente, ponderando Lei e Amor nas decisões.

Gera a constante atenção ao caminho tomado, provocando nessa andança as necessárias conversões, naquelas vezes em que formos chamados a fazer algum desvio de rota e aí as "perdas de ônibus" poderão acontecer. 

Fazer tal profissão de fé exige que, anteriormente, se tenha assumido a vida. Isto significa que ela não será mantida guardada no comodismo do “estar bem” e “isto não é mais comigo, já fiz a minha parte...”.

Tem o sentido radical de que ela será gasta, solidária e atenciosamente, com os irmãos. Ter Jesus como o Messias é se fazer como Ele: servidor. Tal postura retira o seguidor da zona de conforto sombreada e o leva ao protagonismo da ação sob o sol. Gera renúncias e a superação de si mesmo. Torna-nos messiânicos a anunciar que um outro mundo é possível. Jesus, o homem serviço, no dizer do grande Bonhoeffer, gastou a sua vida conosco para que a invistamos nas pessoas à volta, como o nosso bispo da história de hoje fez com a pessoa chata. .


A cruz é muitas vezes confundida como simples objeto de adorno, o que é uma pena. Foi a arma, o instrumento de suplício daquele que gastou a vida, até a última gota de sangue, por todos nós. Temos que entender que ela não foi queimada no calvário. Continua, mais que pendurada nos peitos. Está presente no ombro de cada um que se assume discípulo. Não há cristão sem cruz. 

Um olhar para o mundo nos mostrará que para alguns discípulos a cruz carregada pode significar inclusive a perseguição e a morte. Este não é o nosso caso. Vivemos plena liberdade de culto e de fé. É preciso então que encontremos na nossa cruz outros significados de seguimento.

Um deles, essencial, é que nela se faça presente o pequeno, o pobre e o excluído (e os chatos estão nesse grupo). É bem possível que na cruz carrregada esteja pregado, sem que o estejamos vendo, algum sofredor para o qual o Senhor esteja me pedindo atenção e cuidado.

Pistas para reflexão


- Quem é Jesus para mim?

- Até que ponto tenho gasto, ou guardado a minha vida?

- Quem está pregado à minha cruz?


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Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 10/09/2012
Alterado em 06/09/2021


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