Querida Laura,
Paz!
Seu e-mail vem me falar da sua grande tristeza. Traída pelo marido agora se debate entre dois sentimentos. De um lado a raiva tremenda, a vontade de jogar tudo para o alto. Do outro o olhar o passado, ver que ainda o ama e aí nasce a angústia pela constatação da sua incapacidade de perdoar.
Pois é, amiga. O perdão é realmente difícil. Não é por acaso que costumamos dizer tratar-se de algo divino. Perdoar pressupõe uma caminhada rumo a um novo pacto. A uma recontratação, poderemos dizer assim, da relação de confiança que se encontra senão rompida pelo menos rota, esgarçada. No intuito de ajudá-la, proponho-lhe esses dez passos para que os reflita e os siga rumo a um novo tempo de liberdade.
Sim, é isto mesmo. Perdoar é se tornar livre. Quando a gente está com muita raiva de alguém, como é o caso quando somos traídos, a outra pessoa se torna presença constante em nossa memória.
O dia e a noite toda, vira e mexe, ela retorna aos nossos pensamentos. Não é raro que até sonhemos com ela. Perdoar é libertar-se da prisão de ter essa espécie de ideia fixa do outro em nós. Mas não é só isto... Perdoar é muito mais... Bem, vamos então aos pontos que lhe sugiro...
1 – Refletindo sobre a traição - Comecemos com uma breve reflexão sobre a traição. Na verdade você não me conta por que foi traída. Mas presumo tenha sido a partir da presença na relação de amor com seu marido, de uma terceira pessoa. Aqui é importante ressaltar também que existem vários outros tipos de traição. Algumas bem sutis, mas que nem por se dar assim, delicadas e mesmo imperceptíveis aos olhos, deixam de se configurar também em traição. A mentira, a falta de afeto, o pensar somente em si mesmo, o descuidado... são todas traições ao compromisso que vocês assumiram um com o outro, perante Deus e a comunidade. Numa sociedade profundamente marcada pela sexualidade, parece que a traição se dá somente a partir do ato sexual. Trair vai mais além. Leve isto em sua consideração.
2 – Motivos da traição - A traição, a menos por dois motivos: que não mais exista Amor entre o casal, ou no caso de um dos dois ter alguma questão patológica não resolvida; só ocorrerá naqueles casos em que houver algum espaço vazio na relação do casal. Tempo então de refletir sobre os porquês de ter acontecido tal fato. Que espaço em branco existia entre vocês e que propiciou este fato tão doloroso?
3 – A armadilha dos espaços vazios - Alguns exemplos de espaços vazios que são costumeiros entre casais: a ) A dura rotina é um deles. “todo dia ela faz tudo sempre igual” nos diz a canção. Há que se quebrar a rotina. Não deixar que se instale. b) O excesso de trabalho de um dos dois ou de ambos. Faz com que se ponha toda a energia fora de casa, esquecendo-se de que em casa o outro está necessitado também de carinho e afeto. c) O olhar focado somente nos filhos. Ao invés de se olharem, como nos tempos de namoro, os dois passam a mirar somente para os filhos, esquecendo-se de que necessitam do olhar um do outro. Não se fixe somente nestes exemplos. Pesquise se algum outro possa estar acontecendo entre vocês.
4 – O perdão – Perdoar é divino, nos ensina a sabedoria popular. Perdoar jamais tem o significado de esquecer. Isto é doentio. Quando começamos a nos esquecer das coisas importantes, logo nos é sugerido ir ao médico. Perdoar é fazer memória com Amor. É relembrar sabendo que o acontecido deixou uma marca, uma ferida. O perdão acontece quando a ferida é cicatrizada. Lembre-se de Jesus. Ele perdoa, mas as marcas da crucifixão permanecem indeléveis nele. Lembra-se de que ele ordena para Tomé colocar os dedos nas suas feridas? Elas estão lá, mas não mais doem. Apenas nos marcam a história das nossas vidas. Como as rugas também as registram. Veja quando estará pronta para dar este passo. Depois de dá-lo você se sentirá mais livre.
5 – Reconciliar – Perdoar é um passo que depende de você somente. Já a reconciliação, o passo seguinte no processo, irá pressupor a adesão do outro. Busque reconciliar-se com seu marido. Afinal vocês são seres humanos e não anjos. As falhas são inerentes à nossa condição. “Quem não tiver pecado que atire a primeira pedra”, dizia-nos a este respeito o próprio Jesus. Reconciliar pressupõe um novo tipo de pacto. No seu caso irei me ater ao mais profundo: o pacto de comunhão. Resgatar a comunhão com a pessoa amada é algo maravilhoso e fará com que a relação de vocês passe a se dar num nível mais profundo, daquele que acontecia anteriormente. As crises precisam ser aproveitadas como fatores de crescimento.
6 – Resgate do namoro – Hora de resgatar o namoro. Sim, isto mesmo. Voltar àqueles tempos gostosos nos quais namoravam e ansiavam pela presença do outro. Andar de mãos dadas, como antigamente. Deixar as crianças um pouco com a avó ou uma cunhada e ir fazer aquilo que lhes dava prazer quando namorados e noivos. Um cinema a dois. Aquele banco da pracinha. A pizza no sábado, o passeio no parque. Além de que o namoro é muito bom e nos faz grande bem, sem ele vocês irão correr riscos, eis que darão espaços vazios na relação. Namorar faz parte do casamento.
7 – Resgate dos sonhos – Muitas vezes andamos pela vida carregando sonhos mortos. Explico-me. Sonhos mortos não são ruins, Pelo contrário, foram muito bons. Só que já se concretizaram e portanto deixaram de ser sonhos. Dou exemplos. Enquanto namorados havia o sonho de comprarem juntos um apartamento. Conseguiram adquiri-lo e inclusive já moram nele. Ter um ou mais filhos. Os tiveram. Viajar juntos. Já viajaram. Quem sabe não é esta a boa hora para criarem novos sonhos a dois. Sonhar de novo juntos alguns projetos para o futuro. Os sonhos não necessariamente precisam estar na dimensão do ter. Melhor até que sejam agora no espaço do ser.
8 – Recontratar a relação – Aquela pessoa com quem você casou não existe mais, da mesma maneira que você também é alguém muito diferente, daquela que subiu ao altar com seu marido. Os gregos, quatrocentos anos antes de Cristo, já nos ensinavam que o ser humano jamais cruza duas vezes o mesmo rio. Ou mudou ele, ou mudou o rio. No seu caso mudou você, mudou ele e mudou o rio. É preciso então recontratar a relação.
9 – Colocando os meios. Como recontratar – Não faça isto em qualquer hora. Muito menos quando estiver mal, ou com raiva. Reze antes e escolha um bom momento. Crie um bom ambiente de conversa. E conversem com liberdade. Mais que falar, é fundamental que esteja aberta a escutar. Escutar é muito mais que ouvir. Para ouvir a gente usa o nosso aparelho auditivo. Para escutar utilizamos o coração. Escutar é não se colocar armada. É ouvir e dizer o que poderá dar daí em diante para a relação. Escute dele também o que ele irá dar pelo seu lado. Ao final terão feito um novo contrato, como aquele que fizeram no dia do casamento. Só que agora estão mais maduros e conscientes. Se tudo der certo, celebrem.
10 – Fé na pessoa amada e fé em Deus – Não basta resgatar a fé somente na dimensão humana. É tempo de recontratar também a relação de vocês dois com Deus. Aliás, viver este processo até aqui pressupõe a presença dele. Sozinhos nada podem fazer. Se chegaram aqui é porque Ele está em vocês. Afinal onde reina o Amor, Deus aí está. Reze mais. Reze por ele e mais ainda, ore com ele. Ofereça o Amor de vocês a Deus e lhe peça as forças e a coragem para seguir adiante. Sim, manter o casamento é algo bem difícil. Quantos ao acontecer o que lhe ocorreu não jogam tudo fora... Esquecendo-se de tanta coisa bonita que já viveram juntos. Busquem um grupo de casais ou um grupo de amigos com os quais possam conversar e partilhar a vida a dois. Lembrem-se sempre que no meio da família Jesus se faz presente.
Daqui distante rezo e torço por você, pelo resgate do seu casamento, pela sua capacidade de perdão e pelos passos que irá dar em direção à reconciliação.
Receba o meu abraço fraterno,
Fernando.
Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 02/02/2013