Fernando Cyrino

Caminhando e saboreando a vida.

Textos

Jesus não aceita a violência - Liturgia da Missa – Reflexões para a Mesa da Palavra – Ano C – 13º Domingo do Tempo Comum 

Estava chegando o tempo de Jesus ser levado para o céu. Então, ele tomou a firme decisão de partir para Jerusalém, e enviou mensageiros à sua frente. Estes puseram-se a caminho e entraram num povoado de samaritanos para conseguir alojamento para Jesus. Mas, os samaritanos não o receberam, porque Jesus dava a impressão de quem se dirigia para Jerusalém. Vendo isso, os discípulos Tiago e João disseram: «Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu para acabar com eles?» Jesus, porém, voltou-se e os repreendeu. E partiram para outro povoado. Enquanto iam andando, alguém no caminho disse a Jesus: «Eu te seguirei para onde quer que fores». Mas Jesus lhe respondeu: «As raposas têm tocas, e os pássaros têm ninhos; mas o Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça». Jesus disse a outro: «Siga-me». Esse respondeu: «Deixa primeiro que eu vá sepultar meu pai». Jesus respondeu: «Deixe que os mortos sepultem seus próprios mortos; mas, você, vá anunciar o Reino de Deus». Outro ainda lhe disse: «Eu te seguirei, Senhor, mas deixa primeiro que eu vá me despedir do pessoal de minha casa». Mas Jesus lhe respondeu: «Quem põe a mão no arado e olha para trás não serve para o Reino de Deus». Lc. 9, 51-62

Dois cães, se encontram após terem passeado no parque de diversões. O primeiro se encantara com a experiência vivida na sala dos espelhos. É que encontrou um cachorro querendo se divertir. Um cão igual a ele. Brincou o tempo todo e tudo que fazia, por mais alegre, ou bobo que fosse, seu colega de imediato o imitava. Aquela havia sido uma tarde maravilhosa. Ao contrário, o outro cachorro estava emburrado e foi logo reclamando. Pena que a sala de espelho que fui era diferente. Foi horrível. Lá havia também um cão igual a mim. Só que violento, não estava para brincadeiras. Aí eu lati para ele e ele latiu de novo para mim. Mostrei os dentes e ele arreganhou a bocarra. Mostrei as garras e ele quis me ferir. Nunca mais quero visitar este parque.  

A passagem de Jesus no caminho da vida de cada ser humano é sempre uma experiência fundamental. A partir dela, que se faz o centro, todas as outras vivências se recompõem. Vemos isto no Evangelho de hoje. Notemos que Jesus encontra três pessoas no caminho para Jerusalém.

Dois se dispõem já para o seguimento e o outro, antes que tomasse alguma atitude de falar com Ele, é logo convidado por Jesus para segui-lo.Na primeira leitura (1Rs 19,16b.19-21) vemos Elias escolhendo o seu sucessor. Para isto ele passa e faz o convite lançando sobre o escolhido, Eliseu, o manto. É um chamado que também exige um sim radical e é assim que o novo profeta responde. Só pede para ir se despedir da família e já volta sacrificando seus bois, o que significa que ele não exerce mais a função que até àquela hora era dele.

Jesus quer ainda mais. A resposta que pede se torna bem mais profunda que no Primeiro Testamento. Mas aqui é preciso haver um pouco de cuidado: Vejamos que seria fundamentalista achar que Jesus não quer que nos despeçamos dos nossos entes queridos. Fosse assim não teria ido até o seu amigo Lázaro. O que Ele quer é o mesmo que Elias.

É a mirada para a frente, pois é de lá que o Espírito nos acena. Permanecer na atitude incoerente de olhar para trás, ao mesmo tempo em que se dirige o arado, significa que o sulco se tornará torto, como também a vida.O discipulado é radical. Ele não é algo prosaico como o seguimento de um desfile, ao qual vamos por se estar disponível e não haver nada melhor para se fazer naquele  momento.

Jesus vem nos mostrar, através das palavras de Lucas, três significados do seguimento aos quais o discípulo precisa estar atento:

- O primeiro é que segui-lo não tem a propriedade, nem irá fazer a mágica, de nos livrar dos perigos do mundo.

- O segundo sentido nos traz a dimensão da vida eterna. Para que ficar enterrando os mortos se o sentido final da vida não se coloca na sepultura, mas na ressurreição?

- O último ponto diz respeito aos adiamentos, a nunca colocar os meios efetivos para responder a Jesus. Deus está adiante, O Espírito se move, não é estático e nem fica preso ao passado.

Curioso repararmos também que se trata do chamamento de três pessoas sem nome. Ao convocar anônimos Lucas convida, a cada um, para uma reflexão concreta na vida. Não são nominados para que se possa colocar o próprio nome na situação mostrada.

Esses três convites tornam-se consequentemente os meus próprios chamados para o discipulado. E aqui vale nos perguntarmos como essas convocações repercutem em nós.O que aconteceu com esses três convidados? O Evangelho não nos conta, mas de uma coisa podemos ter certeza.

As palavras que Jesus lhes dirigiu transformaram suas vidas. A forma dessa mudança, para onde ela os levou e para que não sabemos. O fato é que se não o seguiram, permanecendo presos às suas correntes, não cumpriram a missão para a qual foram criados.

Contemplando este texto gosto de imaginar que eles responderam no seu estado de vida, como nós leigos, a este chamado do Senhor. E pensar assim me é consolador.

O evangelista também nos diz que Jesus toma a firme decisão de subir para Jerusalém. Firme porque Ele sabe que é lá que está o seu objetivo. Nós todos também, como discípulos missionários, somos convidados por aquele a quem seguimos a imitá-lo, subindo também para a nossa “Jerusalém” com todas as decorrências que esta subida pode ter. Onde está e qual é esta situação de Jerusalém na minha existência, caberá a cada um discernir, para que desse jeito possa se colocar no caminho.

Haverá gente que não quererá subir e, mais ainda, que não ajudará aos que se põem na escalada. Devemos respeitá-los nessa sua decisão, para não cairmos na tentação da resposta vingativa de Tiago e João, os “filhos do trovão”, a Jesus.

O cristianismo não prega a violência. Ela não resolve e Jesus ensina aqui aos seus amigos e a nós que precisamos evitá-la.Nesses tempos em que se exige mais justiça, e que haja mais cuidado e respeito para com o nosso país, refletir sobre este Evangelho pode nos ajudar a discernir os caminhos que devemos seguir, para trazer para mais perto de nós o Reino de Deus.

A violência utilizada por tantos hoje em dia não traz a solução para os nossos problemas. Ao contrário, os aumenta. A violência que nesse caso do Evangelho é explícita e muito contundente, como tem acontecido diariamente em nosso país, também pode se dar também de maneiras delicadas e sutis e não é porque se dão assim, que deixarão de ser agressivas.

Continuando a mirar o nosso Brasil, podemos ver que a corrupção acontecida tantas vezes em ambientes sofisticados e recheadas de palavras bonitas, nos salões dos nossos governantes, demonstra esta triste realidade. Acaso ajamos no mundo com meios violentos, e a corrupção é violência que mata muita gente, receberemos em troca mais violência ainda, como na história dos dois cachorrinhos de hoje. A vida dá um jeito de nos devolver aquilo que lhe entregamos...

Em Jesus é completada a revelação de Deus iniciada no Primeiro Testamento. Ao compararmos a reação de Elias, que quer usar o fogo como arma para destruir quem o rejeita, com a de Jesus que repele qualquer violência contra os samaritanos, que não os querem receber, temos um bom exemplo da revelação progressiva de Deus em Jesus. À violência, é o que veremos no Senhor, não se responde com mais violência, mas com o mandamento novo do amor.

O Pe. Antony de Mello nos conta a parábola da águia criada no galinheiro e que amarrada para não voar, termina por se acostumar à vida no chão. E no chão ela não é livre, não podendo cumprir o seu destino. A liberdade é viver no amor. Nós, que somos criados para o alto, tantas vezes nos vemos amarrados e presos à terra, em cercadinhos com as portas trancadas que não nos conduzirão a lugar algum.

Acomodar-se à prisão da rotina do menos, é o mais fácil e não gerará compromissos, mas criará uma vida mesquinha que não é aquela em plenitude para a qual estamos sendo criados.Investiguemos se não é por conta desse descompromisso que nos acomodamos ao que é pequeno e passageiro. 

Escrevendo aos Gálatas na segunda leitura, São Paulo nos fala dessa criação para a liberdade. Ser livre é ser águia e sair voando bem alto como pede o destino de cada um de nós, filhos queridos de Deus. Ser livre é não deixar que aquilo que me amarra e prende ao chão impeça que eu suba, com Jesus, para a minha “Jerusalém”.

Pistas para reflexão:

- Em algum desses chamados eu me identifico? Qual é a resposta de seguidor, de discípulo missionário, que dou a Jesus, quando Ele passa por mim?

- Dou-me conta de que segui-lo gera decisões e consequências concretas para a vida? Como se dá em mim a consideração da dimensão de eternidade da existência? Estou preso ao já acontecido, ou vejo que Deus está sempre me convidando para seguir adiante?

- Que resposta dou à minha existência. Devolvo paz ou retribuo com violência?


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Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 24/06/2013
Alterado em 25/06/2022


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