Fernando Cyrino

Caminhando e saboreando a vida.

Textos


Conversão para que tudo ganhe novo sentido e sabor -  Reflexão sobre a Mesa da Palavra – Ano A – Segundo domingo do Advento

Naqueles dias, apareceu João Batista, pregando no deserto da Judéia: 'Convertei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo.' João foi anunciado pelo profeta Isaías, que disse: 'Esta é a voz daquele que grita no deserto: preparai o caminho do Senhor, endireitai suas veredas!' João usava uma roupa feita de pêlos de camelo e um cinturão de couro em torno dos rins; comia gafanhotos e mel do campo. Os moradores de Jerusalém, de toda a Judéia e de todos os lugares em volta do rio Jordão vinham ao encontro de João. Confessavam os seus pecados e João os batizava no rio Jordão. Quando viu muitos fariseus e saduceus vindo para o batismo, João disse-lhes: 'Raça de cobras venenosas, quem vos ensinou a fugir da ira que vai chegar? Produzi frutos que provem a vossa conversão. Não penseis que basta dizer: 'Abraão é nosso pai', porque eu vos digo: até mesmo destas pedras Deus pode fazer nascer filhos de Abraão. O machado já está na raiz das árvores, e toda árvore que não der bom fruto será cortada e jogada no fogo. Eu vos batizo com água para a conversão, mas aquele que vem depois de mim é mais forte do que eu. Eu nem sou digno de carregar suas sandálias. Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo. Ele está com a pá na mão; ele vai limpar sua eira e recolher seu trigo no celeiro; mas a palha ele a queimará num fogo que não se apaga.' Mt. 3,1-12

Alguém, um dia, com um olhar novo, olhou para o menino de rua e reparou que suas pernas e pés eram marcados por muitas topadas. Olhando-o desse jeito diferente foi fácil perceber que ele enxergava bem mal. A boa pessoa levou-o ao oftalmologista e ficou emocionado quando ele pôde enfim usar óculos e perceber com muito mais nitidez, numa alegria imensa, a realidade ao redor. Não que o mundo tenha se tornado outro. O que mudara eram os óculos. Eles fizeram com que as coisas vistas anteriormente como sombras, ou vultos, agora se fizessem em mil detalhes e cores. Lindas.

“Naqueles dias apareceu João Batista pregando no deserto da Judéia”. Chama-me a atenção essa forma como Mateus anuncia o profeta. Após haver tratado nos capítulos um e dois do nascimento e da infância de Jesus ele, de imediato, vem nos falar assim dessa pregação. 
Esse jeito de dizer do evangelista dá a impressão de que há uma continuidade de tempo entre o que foi contado antes e o que vem relatado agora. Mas entre os fatos do capítulo segundo e os que temos narrados no Evangelho de hoje há um período muito grande. Da infância de Jesus temos um salto para “aqueles dias” do início, adulto, da sua vida pública.

Mateus traz-nos aqui outra dimensão do tempo. Muito mais rica e profunda. “Naqueles dias” nos quais pregava João Batista acontecia a plenitude dos tempos e quando Deus se faz presente, ele passa a ter outra contagem. A manifestação de Jesus como Messias salvador da humanidade traz novo olhar sobre tudo.

O tempo que é afirmado aqui é o kairós e para este não faz o menor sentido o cálculo dos dias e anos. A vinda de Jesus torna pleno o mundo e dá novo sentido ao tempo. É como se a sua chegada recolhesse num único momento tudo o que já havia passado, o presente ali vivido e o futuro dentro do qual estamos.

“Naqueles dias” o Antigo Testamento era terminado e as palavras duras proferidas por João soam-nos como as derradeiras da primeira parte da Bíblia. Ditas pelo último profeta da Aliança antiga, elas nos afirmam que para acolher o Deus que vem precisamos de conversão. Nas palavras de hoje poderíamos falar que “sem conversão, sem chance” de ver verdadeiramente a Deus.

Por isto a importância de João Batista nesse segundo domingo do Advento. Não é possível o acolhimento do Menino Deus sem que haja em nós uma mudança. Mais do que mudar de caminho, para receber Jesus é preciso mudar de olhar. Sem ter um olhar novo não se é capaz de sentir Deus nascendo no mundo e nas pessoas em volta.

Não que tenhamos agora um “olhar mágico” capaz de transformar o mundo. Ele permanece do mesmo jeito, tal qual o do menino das canelas marcadas. O que muda a partir da conversão (metanóia) é a forma de vê-lo. Aquele que está em processo de conversão consegue perceber e sentir novos sentidos naquilo que para os demais continua igualzinho.

Desnecessário dizer do quanto o mundo precisa desse novo olhar. Como as pessoas estão carentes e necessitadas dele. É esse contemplar de justiça e de misericórdia, olhar divino sem dúvidas, que faz com que, conforme a visão de Isaías, o mundo se transforme totalmente e haja paz. Uma paz tão grande que não mais será preciso ter medo dos outros. Na linguagem poética da escritura ninguém mais será fera para o seu irmão. Todos conviverão pacificamente e os animais selvagens poderão ser conduzidos pelas crianças.

Do tronco seco brotará o verde que logo florescerá. São imagens bonitas e idílicas de Isaias para nos falar da vinda do Messias. Nosso Deus é o Deus da vida e a sua chegada faz com que até aquele tronco seco, que parece estar morto, reviva. Jesus vem e nos “batiza com o Espírito Santo e com o fogo”.

A sua chegada faz com que seja reanimado o Batismo que um dia recebemos e que pode ter ficado meio como esse “tronco seco” do qual nos fala o profeta. Jesus vem e traz consigo a realidade do Reino. É nosso trabalho, de batizados revigorados pela chegada do Messias, fazermos com que ele se faça mais presente entre nós.

Pistas para reflexão:


- Identifico na vida esses tempos fortes de kairós nos quais senti em mim o Senhor?

- Em que o Menino Deus me convida a mudar o olhar?

- O que em mim está seco e precisa ser revivificado?



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Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 02/12/2013
Alterado em 25/11/2022


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