Do essencial e dos acessórios
Apesar de criados para a vida na essência, como seres fundamentais na Terra, perdemos a base e terminamos por nos empenhar somente com os tantos acessórios que se nos vão apresentando.
Sim, vindos à vida mais para o ser e o transcender nos tornamos, tantas vezes, prisioneiros de pessoas e de coisas não relevantes, e reparemos que esses e essas são ligadas ao ter. Vejam como nos referimos até às pessoas: minha esposa, meu marido. Ou às coisas: meu carro, minha casa. Essa tensão do possuir faz com que, perdidos, foquemos os olhares nas cascas e não notamos que no interior está a riqueza do universo e dentro delas suas coisas e principalmente as pessoas.
Essa fixação no ter, em possuir e dominar gentes e coisas, termina por nos fazer confusos. O ter, a princípo, nos gera alguma consolação e podemos mesmo nos sentir pacificados, saciados por ele, mas essa satisfação é ilusória. Ela acaba logo e o gosto que fica na boca, depois que a posse haja partido não é, definitivamente, dos melhores.
Voltar à essência é fundamental para a felicidade. A questão é que não se trata de caminho simples e muito menos fácil a ser percorrido. É que presos à falsa percepção de felicidade, terminamos por não marcar alguns elementos da trilha, até então percorrida, e o retorno à casa essencial, onde seremos realmente felizes, se torna difícil eis que contem não poucos perigos.
Por isto é sempre complicado tentar a volta sozinhos. Por não termos feito um mapa dos acidentes geográficos, quando no ilusório caminho de ida e que tantos enganos nos propiciou, os passos solitários poderão fazer mesmo com que a gente possa se sentir ainda mais perdidos.
Por isto, essa conversão para a essência necessita de algum tipo de mediação. Algum suporte para nos auxiliar na retirada das máscaras que fomos vestindo, na medida em que nos íamos enganando e quanto maior o engano, maior o número das máscaras acrescentadas ao rosto, ao corpo, bem como também ao coração.
Aqui é preciso outro tipo de cuidado, eis que o mundo é supermercado pleno de ofertas de mediações. Acaso se apanhe alguma que não nos sirva. Uma mediação equivocada o engano poderá mesmo se tornar fatal, eis que será, nada mais nada menos do que o engano do engano, um beco sem saída para o qual não mais se poderá força para buscar a saída válida.
Retornar no caminho é separar-se de si mesmo e, lá de fora, se olhar não para a casca, mas lá para dentro, o conteúdo. Como se houvéssemos invertido os olhos e agora eles se encontrassem focados lá no nosso interior. E esse novo olhar será, este detalhe é importante, como o das aves noturnas. Deverá olhar no escuro, eis que serão as sombras aqueles pontos nos quais terei que colocar maior atenção.
A meditação apresenta-se como uma dessas mediações mais válidads e interessantes e há escolas bem bonitas e significativas nessa linha. Meditando se entrará na dinâmica desse olhar interior do retorno e se poderá ver melhor aquilo que, no dia a dia, a gente tende a não reparar.
Assim ela nos ajudará a chegar, de novo, até a essência perdida. Somente vivendo-a seremos capazes de nos realizar como seres humanos. Essa essência, pode ter vários nomes. Todos muito bonitos. Aquele que, no meu modo de ver, melhor é capaz de nomeá-lo é Deus.
Fernando Cyrino
Enviado por Fernando Cyrino em 14/09/2015
Alterado em 04/11/2016