MENINO TRISTE (ec)
No seu bairro ele era conhecido como o menino triste. Mesmo quando ainda bebê era de pouco choro. Criança calada demais e o fato de não reclamar e nem se derramar, como as tantas outras, em abundantes lágrimas, não queria dizer que fosse ao menos um pouco feliz. O garoto carregava no corpo uma angústia imensa, bem maior mesmo do que a aflição somada de todos os que moravam em sua casa e nas vizinhanças.
Ele gostava de quase nada e desgostava de um tanto de coisas. Dentre essas havia uma que lhe causava um incômodo bem grande: haver gente por perto e o pior é que sentia que a família sofria dessa mania esquisita de querer estar junto. Parecia, o guri achava, que o seu povo curtia o prazer de se aproximar dele, como se o vigiassem, e nessas horas em que estavam juntos era fatal que viessem as perguntas: O que você está sentindo? O que lhe está causando tanta amargura? Por que não sorri? A verdade é que a sua gente lhe fazia questionamentos que o incomodavam demais.
Um dia aconteceu a grande descoberta, é que nas suas escapadas ele terminou por encontrar a escada. Era uma bem grande e que ficava meio escondida nos fundos do quintal. Nessa mesma hora ele viu que ela era boa de se estar só, pois os demais moradores não costumavam subir nela. E foi então que o menino se acostumou a escapar para o que passou a chamar de “a minha escada”.
De vez em quando vinha o medo, mas nessas horas ele olhava firme para o alto, como se pedisse à coragem para que tomasse conta dele. Logo ele já estava se sentindo capaz novamente e aí trepava mais um degrau. A mãe descobriu para onde ele se acostumara a fugir e gritava da cozinha: “Desce daí garoto, o alto é perigoso”. Uma manhã de céu muito azul e brisa suave ele chegou lá em cima e se descobriu livre. Aí o menino, sorrindo, voou.
Este conto faz parte dos Exercícios Criativos. Para conhecer mais obras com o tema: “Será que é bom morrer” visite-nos em: http://encantodasletras.50webs.com/seraqueebommorrer.htm